outubro 10, 2019

PARASITE (filme, 2019)




País: Coréia do Sul
Gênero: Drama, Suspense
Duração: 131 min.
Distribuição: CJ Ent.

Direção: Bong Joong-ho
Roteiro: Bong Joong-ho, Han Ji-won
Fotografia: Hong Kyung-pyo

Elenco: Song Kang-ho, Jang Hye-jin, Choi Woo-sik, Park So-dam, Lee Sun-kyun, Cho Yeo-jeong, Jung Ji-so, Jeong Hyun-jun, Lee Jung-eun, Park Myung-hoon.

Resumo

A família Kim, unida na pobreza e no desemprego, vislumbra um futuro melhor ao conhecer a família Park, que desfruta das infinitas benesses da alta sociedade.

Comentário

(sem spoilers, fora observações sobre o perfil de alguns personagens)

O cultuado diretor Bong Joong-ho está de volta com uma produção cem por cento coreana, depois de dois projetos internacionais, Snow Piercer (2012) e Okja (2017). O resultado foi dos mais positivos, e Parasite foi aclamado por público e crítica, tendo faturado a tão cobiçada Palme d´Or, no Festival Internacional de Cinema de Cannes.

À parte da qualidade indubitável do filme, a aprovação quase unânime de Parasite se deve, sem dúvida, ao seu tema de apelo universal. A desigualdade social está presente em todos os cantos do planeta, e a estória da família Kim poderia ser a estória de vida da família Silva, Smith, Suzuki, e assim por diante... Para os coreanos, o filme deve calar ainda mais fundo, já que foram séculos de guerra, fome e escravidão na estória do país, que nos últimos anos vive um renascimento social, cultural e tecnológico invejáveis. No entanto, esta mesma evolução industrial não alcança uma parte da sociedade, que é empurrada cada vez mais para a periferia das metrópoles, ficando apenas com as migalhas do sonho capitalista. E a família Kim faz parte desta fatia desprivilegiada da sociedade, fora do mercado de trabalho formal, sem educação, ou alimentação saudável.

Kim Ki-taek (Song Kang-ho, - A Taxi Driver, The Host), motorista desempregado, compartilha, com mulher e casal de filhos, um apartamento no subsolo de um prédio, infestado de pragas e pouco iluminado. Sua esposa, Chung-sook (Jang Hye-jin, - Family Affair), uma ex-atleta medalista, parece conformada com a situação precária da família, que trabalha unida montando caixas de pizza, em troca de alguns centavos. O casal de filhos, Ki-woo (Choi Woo-sik,- Train to Busan) e Ki-jung (Park So-dam, - Beautiful Mind) vai na onda dos pais, e vive numa espécie de torpor, diante das desanimadoras perspectivas de vida. A união familiar, ao invés de ser comovente, parece apenas ressaltar suas fraquezas pessoais.

Certo dia, o jovem Ki-woo sai para beber com seu único amigo dos tempos de escola, Min-hyuk (Park Seo-joon, - Fight for My Way), e este lhe propõe que assuma seu ‘bico’ de tutor de inglês de uma garota rica, já que ele está indo estudar no exterior por uns tempos. Além do mais, Min-hyuk confessa estar apaixonado pela menina, e planeja pedi-la em namoro assim que ela entrar na universidade. Esta confissão parece despertar mais o interesse de Ki-woo no emprego, do que a oportunidade financeira em si. Antes de partir, Min-hyuk surge no porão dos Kim com um presente de despedida, que parece simbolizar a caixa de Pandora que se abrirá para desencadear os eventos mais inusitados em suas vidas.

Ao ser admitido na mansão da família Park, Ki-woo sente estar entrando em outro mundo, como Alice pisando no País das Maravilhas, repleto de personagens tão fascinantes quanto bizarros. A dona da casa, Choi Yeon-kyo (Cho Yeo-jeong, - Divorce Lawyer in Law), é uma mulher frágil, que tenta disfarçar sua insegurança social com uma dedicação obsessiva com as vontades do marido. O Sr. Park (Lee Sun-kyun, - My Mister, Miss Korea), empresário bem sucedido, sob um verniz de educação e civilidade, é um homem esnobe e preconceituoso. A filha, Da-hye (Jung Ji-so, - Hwajung) é uma adolescente típica, mais interessada em romance do que nos estudos. Seu irmão caçula, Da-song (Jeong Hyun-jun, - Nokdu Flower), é um menino mimado, cujas birras são interpretadas pelos pais como genialidade, ou ainda um trauma psicológico misterioso. Apesar da afetação da Sra. Choi, quem administra a casa com mão de ferro é a governanta Gook Moon-gwang (Lee Jung-eun, - Strangers from Hell).

Não demora muito para que Ki-woo veja a oportunidade de trazer sua irmã, Ki-jung, para dentro da mansão dos Park, como tutora do caçula da família. O desembaraço com que os irmãos lidam com a família Park nos faz questionar o porquê de sua situação social tão precária. Será que um diploma ‘5 estrelas’ e contatos importantes são a única forma de um cidadão ter uma vida decente nesta sociedade? O instigante desta estória é a dualidade de sentimentos (e sensações) que os personagens despertam em nós, espectadores... Quem é o ‘parasita’ do título? Qual o futuro das ditas superpotências tecnológicas, que canibalizam sua própria população, em nome do progresso?

Parasite é um filme precioso, e cineastas autorais, que produzem roteiros originais, são cada vez mais raros no cinema... Com seu prestígio e respeito, Bong Joong-ho pode se cercar de grandes profissionais, como o diretor de fotografia Hong Kyung-pyo (Burning, Snowpiercer), e atores tarimbados como Song Kang-ho, companheiro de tantos outros filmes seus. Ainda que Parasite seja um filme brilhante, eu, como grande fã do diretor, ainda fico com Memories of Murder, muito acima de todos, e como crítica social, ainda prefiro The Host. De qualquer modo, vale a pena conferir os filmes anteriores do diretor, pois a diversão é garantida.

E uma última sugestão, assista Shoplifters (2018), um filme belíssimo, de outro grande cineasta, o japonês Hirokazu Koreeda, com uma temática muito similar a Parasite (e que por coincidência ou não também levou a Palme d´Or em Cannes), e, mais do que comparar as duas obras, é interessante refletir sobre o mundo estranho e desafiador em que vivemos.
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